terça-feira, 31 de agosto de 2021

A Militância do Ego - Intolerância


Estou prestes a completar 38 anos e sinto que vivo um momento de muita reflexão existencial. Não sou tão jovem a ponto de não considerar a existência do amanhã, mas também não sou tão experiente a ponto de não gozar das aventuras da juventude. Esse meio do caminho, vamos dizer assim, tem me trazido muita reflexão. A juventude é enganosa, no sentido achar que o amanhã não existe, nem a morte e nem as consequências das escolhas do agora. Portanto, decisões são tomadas de formas passionais quase que o tempo todo. Hoje eu olho para trás e penso como fui tolo em muitas das minhas decisões, simplesmente pelo ímpeto da juventude. A juventude beira a irracionalidade muitas vezes, porque hoje, mais maduro, eu me vejo naqueles momentos e só me pergunto o porquê de não ter raciocinado e decidido pelo óbvio. Mas a questão é exatamente esta: a juventude nos cega diante de muitos óbvios que só vamos perceber quando atingirmos alguma maturidade. Naquele momento, as decisões mais absurdas são vistas como o melhor caminho incontestavelmente. É como se fossem transes existências. Eles acontecem em qualquer etapa da vida, mas parece que na juventude eles se tornam mais constantes. A juventude é uma dádiva de Deus, mas também é muito enganosa. Passar por ela é um desafio de todo ser humano. 

Os livros de Provérbios e Eclesiastes são, sobretudo, escritos para jovens. O sábio Salomão sempre soube que a vida de uma pessoa pode ser arruinada na juventude, juntamente por esse ímpeto quase que irracional. Algumas decisões da juventude são equivocadas, mas não influenciam tanto na vida futura, como as minhas, outras são fatais. Por que estou falando disso tudo, quando o assunto é ego e intolerância? Porque, primeiramente, o jovem é facilmente dominado pelo ego e, em segundo lugar, todos fomos jovens (ou somos) e também vivemos transes existencias semelhantes. O ego nos domina quando somos jovens insensatos e continua nos dominando quando somos experientes intolerantes. 

Há uma parábola de Jesus que ilustra muito bem isso: 

"Portanto, o Reino dos Céus pode ser comparado a certo rei, que decidiu acertar contas com seus servos. Quando teve início o acerto, foi trazido à sua presença um que lhe devia dez mil talentos. Porém, não tendo o devedor como saldar tal importância, ordenou o seu senhor que fosse vendido ele, sua mulher, seus filhos e tudo quanto possuía, para que a dívida fosse paga. O servo, então, com toda a reverência, prostrou-se diante do rei e lhe implorou: 'Sê paciente comigo e tudo te pagarei!'. E o senhor daquele servo, teve compaixão dele, perdoou-lhe a dívida e o deixou ir embora livre. Entretanto, saindo aquele servo, encontrou um dos seus conservos, que lhe estava devendo cem denários. Agarrou-o e começou a sufocá-lo, esbravejando: 'Paga-me o que me deves!'. Então, o seu conservo, caindo-lhe aos pés, lhe suplicava: 'Sê paciente comigo e tudo te pagarei!'. Mas, ele não queria acordo. Ao contrário, foi e mandou lançar seu conservo devevedor na prisão, até que toda a dívida fosse saldada." (Mateus 12: 23-35)

O servo, que devia ao seu senhor e foi perdoado, não perdoou o seu conservo. Essa é uma das marcas mais profundas que o ego deixa no ser humano, a intolerância. Não importa quantas vezes erramos, se errarem contra nós, não vamos tolarar. Da mesma forma, não temos compaixão de pessoas que insistem em cair em ciladas que já caímos. Mas por que isso? Porque o ego é intolerante. Gostamos quando as pessoas olham as nossas vergonhas e nos dão mais uma chance, no entanto, nós somos os primeiros a cancelarmos aqueles que praticam as mesmas coisas que praticávamos no passado. 

Já fui fundamentalista religioso, fanático, militante por causas vãs e até cruéis, cúmplice de teologias da prosperidade, preconceituoso, entre outras coisas das quais me envergonho só de lembrar, mas hoje não sou mais. Bem aventurado é aquele que se envergonha daquilo que era, porque é um sinal de que as coisas estão andando. Porém, se eu não me ver no fundamentalista e em todos que têm comportamentos e pensamentos como os que eu tinha, eu não aprendi coisa alguma. A minha má experiência não pode fazer como muitas pessoas falam: "por eu ver essa pessoa fazendo o que eu fazia e acreditando no que eu acreditava, eu sinto mais raiva dela.". Esse sentimento é do ego. O nosso deve ser de compaixão. Todos enfrentam esses transes existenciais e ainda vão enfrentar, portanto, ninguém está livre de agir de forma equivocada. Por isso, como ensina a parábola, a intolerância é inadmissível para quem é filho de Deus. 

O ego milita pela intolerância. Para o ego, não importa o que você fez, o que importa é que você não faz mais. Além de te fazer acreditar que o que você fez é menos pior, o ego também te faz acreditar que você nunca será como o alvo da sua intolerância. Ambos os pensamentos são adoecidos pelo ego. O erro do outro é sempre pior do que o seu, ainda que seja o mesmo. Em uma sociedade dominada pelo ego, a intolerância é uma bandeira. Olhe bem para aquela pessoa que você considera odiosa. Se você reparar bem, ela é um espelho do que você foi ou um prenúncio do que você ainda pode ser. 

Se você nunca foi nada parecido com as pessoas que você considera odiáveis, saiba que você não está livre se se tornar como elas. Então, a intolerância não está somente no absurdo de se esquecer do que fomos um dia e apontarmos o erro do outro, mas também a certeza de que nunca seremos como eles. Isso, além de intolerante, é ilusório. Não temos a menor ideia do que podemos ser. Portanto, não seja soberbo ao ponto de tratar com intolerância aqueles que fazem o que nós fazíamos, ou aqueles que fazem aquilo que afirmarmos que nunca faremos. 

Lembre-se da sua juventude e você verá que muito do que você condena ja foi seu estilo de vida. Lembre - se também de Salomão, Judas, Saul e tantos homens de Deus que começaram bem a caminhada com prudência, mas se tornaram instrumento do pecado e do seu próprio ego. 

Quando eu olho para trás, eu também lembro de tanta gente que foi tolerante comigo e como eu sou grato por isso. Então, façamos o mesmo. Talvez se eu fosse cancelado por aqueles que me amaram e me ensinaram em meio aos transes existências, eu não estaria aqui para compartilhar isso com vocês. 

Mediante a tudo isso, eu deixo um conselho: sejam intolerantes! Sejamos intelorantes com o ego, com as nossas falhas, com os nossos maus habitos, com a falta de compaixão, com a nossa falta de fé, com esse ímpeto de ter mais do que ser...Enfim, seja intolerante com tudo aquilo que deforma o nosso caráter. Nós nos toleramos demais e toleramos o próximo de menos. 

Muito cuidado! Esta mão macia que te afaga quando você erra e constantemente aponta na direção do erro alheio, não é Deus, mas do ego.  

Que Deus te abençoe. 

3 comentários:

  1. Aquele que está de pé, olhe para que não caia...
    Obrigada pela palavra!

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  2. Que palavra pertinente é confrontadora, principalmente para tudo que estamos vivendo e presenciando na sociedade.
    Parabéns brother e continue....

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  3. Parabéns pelo texto que nos leva a tão forte reflexão .👏👏

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